Maioria dos brasileiros vê tarifaço de Trump como ato político e imagem dos EUA se desgasta

Pesquisa nacional realizada pela Ipsos-Ipec revela que a grande maioria dos brasileiros, 75%, percebe a recente imposição de tarifas sobre produtos nacionais pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, como uma decisão de natureza eminentemente política

Somam 12% os entrevistados que acreditam que a medida se baseia em uma questão puramente comercial. Há ainda os que acreditam tratar-se tanto de questões comerciais, quanto políticas (5%). Os que preferem não responder ao questionamento totalizam 8%.

O levantamento aconteceu entre 1 e 5 de agosto de 2025 e entrevistou 2.000 brasileiros de 16 anos ou mais e mostra como o Tarifaço impactou a percepção sobre os EUA e expõe uma profunda divisão na sociedade brasileira sobre os próximos passos nas relações diplomáticas e comerciais. A margem de erro deste estudo é de 2 pontos percentuais para mais ou para menos.

Motivação política é consenso, mas com nuances

A crença de que a decisão de Trump é política é majoritária em todos os segmentos demográficos, mas se intensifica sensivelmente entre os entrevistados com 45 a 59 anos (80%), os moradores das Regiões Nordeste e Sudeste (77%, em cada), na comparação com as demais regiões – Norte/Centro-Oeste (71%) e Sul (72%).

A visão política também é relativamente mais acentuada entre os eleitores do presidente Lula no segundo turno de 2022 e aqueles que votaram em branco ou anularam seu voto (79%, em cada um dos estratos), enquanto entre os eleitores de Jair Bolsonaro recua para 73%.

Imagem dos EUA sofre desgaste

Antes da imposição das tarifas, a imagem dos Estados Unidos era predominantemente positiva, visto que 48% a consideravam ótima ou boa. Somavam 28% os que consideram regular e 15% que tinham uma imagem ruim ou péssima dos Estados Unidos; 8% não sabem ou preferem não responder.

Após o anúncio sobre as altas tarifas que seriam aplicadas aos produtos brasileiros, a percepção piorou significativamente: 38% da população afirma que a imagem que tem dos EUA mudou para pior. Para 51% permanece a mesma e apenas 6% relatam uma melhora na percepção sobre o país americano.

O impacto negativo foi mais sentido entre os eleitores de Lula, dos quais 52% passam a ter uma imagem pior dos EUA. Entre os eleitores de Bolsonaro, esse índice é de 26%, com 60% afirmando que a imagem permaneceu a mesma. Proporção semelhante à daqueles que afirmam ter votado em branco ou anulado seu voto em 2022: 33% dizem que mudou para pior e 63% garantem a manutenção da sua opinião.

Da mesma forma, a percepção de piora é mais acentuada entre os católicos (42%) do que entre os evangélicos (32%).

Como o Brasil deve reagir? População dividida e polarizada

Quando questionados sobre as possíveis reações do Brasil, os resultados mostram um país dividido, com opiniões fortemente influenciadas pelo voto em 2022:

1.    Distanciamento dos EUA: A ideia de que "o Brasil deveria reavaliar sua parceria comercial e se distanciar dos Estados Unidos" divide a opinião pública: 47% discordam (30% discordam totalmente e 17% em parte), enquanto 46% concordam (28% totalmente e 18% em parte). A polarização aqui é nítida: 61% dos eleitores de Lula apoiam o distanciamento, ao passo que 65% dos eleitores de Bolsonaro são contrários.

Além do aspecto político, são registradas diferenças entre os perfis sociodemográficos da pesquisa: é maior a proporção de homens (54%) que discorda (totalmente ou em parte) do descolamento dos EUA, do que de mulheres (40%); assim como somam 56% entre brasileiros com renda familiar maior que 5 salários mínimos, mas que recuam para 42% entre as famílias com renda de até 1 salário mínimo. Os moradores da região Nordeste são os que mais concordam com o distanciamento (57% concordam totalmente ou em parte).

2.    Retaliação na mesma moeda: A proposta de que o Brasil deveria responder na mesma moeda, aplicando tarifas altas sobre os produtos americanos também gera uma certa divisão, 49% concordam (33% totalmente e 16% em parte) e 43% discordam (13% totalmente e 30% em parte). Novamente, a clivagem política se repete: 61% dos eleitores de Lula apoiam a retaliação, enquanto 56% dos eleitores de Bolsonaro são contra a medida.

Nesse sentido, também se observam diferenças sociodemográficas: é maior a parcela de brasileiros que moram na região Norte/Centro-Oeste que concordam totalmente ou em parte com a cobrança de altas tarifas aos produtos americanos (58%), enquanto a maioria dos que vivem na região Sul discordam dessa ação (52%); a discordância, ainda que parcial, também é mais percebida pelos evangélicos (50%), do que pelos católicos (41%).

3.    Busca por novos parceiros é consenso: O ponto de maior convergência é a necessidade de diversificar as parcerias comerciais. A maioria dos brasileiros, 68%, concorda que o Brasil deveria priorizar acordos com outros parceiros comerciais, como a China e a União Europeia, sendo 45% totalmente e 23% em parte. O apoio é mais expressivo entre os eleitores de Lula (75%), mas também é majoritário entre os de Bolsonaro (59%).

Ademais, a concordância com a busca por novas parcerias comerciais é mais evidente entre pessoas com maior grau de escolaridade (77%), mesmo percentual atingido entre aqueles que têm renda familiar de mais de 5 salários mínimos.

4.    Medo de isolamento: Seis em cada dez brasileiros concordam totalmente ou em parte que a situação de embate com os Estados Unidos pode deixar o Brasil mais isolado no cenário internacional. Curiosamente, essa preocupação é maior entre os eleitores de Jair Bolsonaro (70%), do que entre os de Lula (53%).

Reação do Consumidor: priorizará o consumo de produtos nacionais

Caso o tarifaço prejudique a economia, a principal atitude que os brasileiros estariam dispostos a tomar seria priorizar o consumo de produtos nacionais (39%). Essa disposição é mais forte entre os que têm ensino superior (48%), os de renda familiar de mais de 2 a 5 salários mínimos (47%), também aqueles com renda acima de 5 salários mínimos (46%) e entre os eleitores de Bolsonaro em 2022 (46%). Em segundo lugar, 22% dos entrevistados afirmam que deixariam de comprar produtos americanos, uma atitude mais citada por quem vive na região Nordeste e por eleitores de Lula (29% em cada segmento).

Ainda são citados: o apoio a políticos brasileiros que defendam o distanciamento dos Estados Unidos, buscando acordos com outros países (9%), o cancelamento ou remanejamento de planos de viagem para os EUA (5%) e o uso das redes sociais e espaços públicos para criticar a medida adotada por Donald Trump (3%). Totalizam 10% aqueles que não estariam dispostos a tomar nenhuma medida e 13% os que preferiram não opinar a respeito.

“Os resultados mostram que o brasileiro interpreta a medida adotada por Trump como uma manobra política, e não apenas comercial, é expressiva e transcende segmentos sociais. Esse sentimento se reflete diretamente no desgaste da imagem dos Estados Unidos junto aos brasileiros. Mais do que isso, a pesquisa mostra a polarização nacional: as reações de distanciamento ou retaliação são um espelho quase perfeito da divisão política do segundo turno de 2022, indicando que a política externa se tornou mais um campo de batalha ideológico interno”, avalia Márcia Cavallari, diretora de Ipsos-Ipec.

Sobre a pesquisa

Pesquisa quantitativa realizada a partir de entrevistas domiciliares, face a face, com o objetivo de levantar a opinião dos brasileiros sobre o tarifaço imposto por Donald Trump aos produtos brasileiros. O levantamento aconteceu entre os dias 1 e 5 de agosto de 2025, quando foram realizadas 2000 entrevistas, em 132 municípios brasileiros. A amostra foi elaborada com base em dados do Censo 2022 e PNADC 2023, com controle de cotas pelas variáveis sexo, idade, escolaridade, raça/cor e ramo de atividade. O nível de confiança da pesquisa é de 95%, e a margem de erro máxima estimada para o total da amostra é de 2 pontos percentuais, para mais ou para menos.

Sociedade