Desigualdade e custo elevado caracterizam mobilidade urbana em 10 capitais do Brasil
Pesquisa realizada em 10 capitais brasileiras traça um retrato desafiador da mobilidade urbana em 10 capitais brasileiras. O estudo, conduzido entre 1 e 20 de julho de 2025 com 3.500 internautas, aponta para uma jornada diária marcada pela desigualdade, longos tempos de deslocamento, uma sensação generalizada de insegurança e um custo que exclui.
Os dados mostram que, em média, os cidadãos gastam quase duas horas por dia (116,5 minutos) em seus deslocamentos. Internautas que moram em Belém (130,3 min) e Manaus (128,2 min) são os que enfrentam os maiores tempos, enquanto em Porto Alegre (94,5 min) e Goiânia (98,6 min) a média é menor.
O transporte coletivo é utilizado de alguma forma por 78% dos respondentes, ainda que esporadicamente. No entanto, o preço da tarifa se impõe como uma barreira social significativa, visto que, devido ao custo da passagem, uma parcela expressiva da população deixa de realizar atividades fundamentais:
60% deixam de visitar amigos ou familiares.
56% abrem mão de atividades de lazer, como ir a parques e cinemas.
48% perdem consultas médicas ou exames.
44% desistem de procurar emprego.
"Os números revelam que o preço da tarifa não é apenas um valor monetário, mas um fator de exclusão social que impede o acesso a direitos básicos como saúde, trabalho e convívio social", afirma Patrícia Pavanelli, Diretora da Ipsos-Ipec.
O abismo entre transporte coletivo e individual
A pesquisa questionou qual o meio de transporte utilizado pelos internautas com mais frequência na cidade. No total da amostra, 35% responderam ônibus/BRT/Move e 18%, carro particular. Em seguida aparecem os carros por aplicativo (9%), o metrô (8%) e a pé (8%). Apenas 1% utiliza bicicleta.
O levantamento evidencia uma clara divisão social no uso dos modais. Enquanto o transporte coletivo é a realidade para 78% dos internautas (com maior adesão entre jovens, classes D/E e pessoas de menor renda), o transporte individual é predominante entre as classes mais altas. O carro particular é o principal meio de transporte para 37% da classe A/B, um privilégio distante da maioria. As diferenças entre as capitais são notáveis:
Goiânia se destaca como a "capital do carro": 69% dos seus internautas utilizam o transporte individual com mais frequência, e 41% têm o carro como principal meio de locomoção, o maior índice entre as cidades pesquisadas. O planejamento urbano da cidade, historicamente focado no transporte individual, pode explicar esse fenômeno.
No extremo oposto, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo são as capitais onde o transporte coletivo é mais utilizado como meio principal de deslocamento, atingindo 60% em cada uma delas.
As urgências do transporte por ônibus
Para os internautas que utilizam ônibus, BRT ou MOVE, os problemas mais urgentes a serem resolvidos são a lotação (23%) e o preço da tarifa (20%). As prioridades, no entanto, variam localmente:Em São Paulo, a superlotação é a principal queixa, mencionada por quase um terço dos usuários (32%).
Em Manaus, o preço da tarifa é o problema mais crítico (30%).
Em Porto Alegre, a principal demanda é por maior frequência das linhas (22%).
Em Belém, o mau estado de conservação dos veículos (20%) é uma preocupação tão grande quanto a lotação (22%).
Tarifa Zero: apoio condicionado à qualidade
Quando questionados sobre a implementação da "tarifa zero", a opinião mais comum (24%) é de que a medida seria positiva, desde que a qualidade e a frequência do serviço fossem melhoradas previamente. Em seguida, 20% veem a gratuidade como uma forma de democratizar o acesso e combater a exclusão social. Embora a ideia seja bem-vista, os internautas temem que a gratuidade sem investimento resulte em um serviço ainda mais precário.
Insegurança generalizada para pedestres
Um dos dados em destaque da pesquisa é a percepção de segurança: 82% dos respondentes não se sentem seguros ao transitar como pedestres em suas cidades. Sensação que é ainda mais acentuada entre as mulheres (87%), em Manaus (87%), Rio de Janeiro (86%) e Salvador (84%). Em contrapartida, Goiânia (63%) e Belo Horizonte (75%) apresentam os menores índices de insegurança para pedestres, embora ainda elevados.
Políticas públicas como um direito fundamental
A pesquisa Ipsos-Ipec aponta para a necessidade urgente de políticas públicas que tratem a mobilidade como um direito fundamental, com soluções passando por três eixos principais:
1. Qualidade e eficiência: Aumentar a frota e a frequência para reduzir a lotação e o tempo de espera, além de otimizar rotas.
2. Acessibilidade econômica e social: Reavaliar a política tarifária, reconhecendo seu impacto social, e debater a tarifa zero com um plano pragmático que inclua melhorias prévias.
3. Segurança integral: Tratar a segurança de pedestres e passageiros como prioridade máxima, com investimentos em infraestrutura (calçadas, iluminação) e segurança pública no transporte.
"Os dados oferecem um diagnóstico claro das dores dos cidadãos. O caminho para uma mobilidade mais justa e eficiente exige investimentos estratégicos e um planejamento que coloque as pessoas, e não apenas os veículos, no centro das decisões", conclui Pavanelli.
Sobre a Pesquisa
A Pesquisa Viver nas Cidades: Mobilidade Urbana é uma realização do Instituto Cidades Sustentáveis, realizada pela Ipsos-Ipec, elaborada com o objetivo de verificar a percepção dos internautas residentes em dez capitais brasileiras sobre temas relevantes relacionados aos meios de locomoção na cidade em que vivem. O universo considera internautas de 16 anos ou mais, das classes ABCDE, que moram nas capitais de interesse há pelo menos 2 anos. O trabalho de campo foi realizado entre os dias 1 e 20 de julho de 2025. Foram realizadas 3.500 entrevistas de forma online, distribuídas entre as cidades de Manaus, Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre e Goiânia, com controle de cotas pelas variáveis sexo, idade, classe social e ocupação.
A amostra foi elaborada com base em dados do Censo 2010, PNADC 2022 e da Ipsos-Ipec, com controle de cotas por sexo, idade, classe social e ocupação. O nível de confiança é de 95% e a margem de erro para o total da amostra é de 2 pontos percentuais para mais ou para menos. Para os resultados por capital, a margem de erro pode variar de 4 a 6 pontos percentuais, de acordo com a amostra da cidade.
Realizada no âmbito do Programa Cidades Sustentáveis, a pesquisa conta com o cofinanciamento da União Europeia, como parte do “Programa de fortalecimento da sociedade civil e dos governos locais para a implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)”. O projeto tem como parceiros institucionais a Frente Nacional dos Prefeitos e Prefeitas (FNP) e a Estratégia ODS.